quinta-feira, 27 de fevereiro de 2014

Sociedade Secreta


Penso que a lista das coisas que acho belas é tão importante para me definir quanto a lista das coisas que me irritam, mas, certamente, a segunda vale muito mais na hora de decidir o que eu quero mudar em mim. Nessa linha da mudança, coloco uma terceira (e mais central): a lista das-coisas-que-me-envergonho-de-ter-feito. Pois então... recordo muito bem a primeira vez que vi um quadro do Jackson Pollock (o quadro do Pollock está na segunda lista). Olhei aquilo sem nenhuma cumplicidade e disparei: “qualquer um pode pintar isso!” (Sim, sim, essa frase está na terceira lista), mas o que falei logo depois foi ainda pior: “não entendo como é que essa turma quer pintar sem saber desenhar nem uma casinha!!” (também na terceira lista).
Mesmo lembrando que eu era muito jovem e estúpido, dá para perceber algo aí...
Parece que em arte, assim como em tantos e tantos ramos das criações humanas, ficamos o tempo todo construindo cerquinhas e murinhos pra regular a entrada seleta de quem vai fazer parte do clube.
“Não dá pra todo mundo ser artista!” (terceira lista.)
Foi então que há uns dias, nesses tempos intermináveis de sol, eu estava na piscina do condomínio onde moro, conversando com um vizinho sobre o meu trabalho como professor do CEFET. Falava da necessidade de oferecer a todos os jovens uma escola como a minha e blábláblá, blábláblá...
Meu vizinho, de repente, me interrompe e fala: “mas cuidado aí! Também, se todo mundo quiser ser bacharel, quem é que vai limpar o chão?” Na mesma hora me virei para pegar uma vassoura e começar a varrer, numa atitude exemplar, quando soou uma sirene interna acionada por um ou dois itens das listas. Respondi só um “sei não...”, botei a viola no saco e fui pra casa, antes de mais nada, desencravar carunchos que insistem em fincar o pé nas minhas ideias. 

 #bravuraindomita
ou
Manual de barbearia do século XX