Estou
juntando material para fazer um blog sobre dois irmãos que calharam
de ser meus tios-avôs, Octávio e Armando Sgarbi. O primeiro, que
teria completado cem anos há alguns dias, eu só pude conhecer pelos
escritos, histórias, ilustrações e alguns quadros. O segundo foi o
interlocutor de tantas infinitas prosas da minha infância nas
aventuras do verbo, da rima das cores e do traço. E foi assim que,
olhando as pastas com desenhos e contos do tio Armando, achei
um texto de minha autoria que tinha sido posto lá, como homenagem -
essa “Farpa” que deixo agora com vocês - realizado algumas horas
depois de sua morte, para tentar driblar a dor pela perda de uma das pessoas
mais brilhantes e queridas desse meu mundo. A figura que fecha a
postagem foi concebida durante esse reencontro...
Farpa
Mais uma batalha. No
meio da confusão, destaca-se um cavaleiro de movimentos precisos,
desferindo golpes que derrubam os inimigos um a um, após lhes
revelar o sabor da espada.
Se
o cavaleiro possuísse uma mente abstrata, ela estaria vazia agora,
sem pensamentos, só ritmo e ação.
De repente (de
onde?), ele sente o toque de uma lança ou lâmina e percebe que está
morto. Cai, cumprindo seu papel com o final dos músculos e do
equilíbrio. O chão lhe parece absurdo assim tão próximo do rosto
e a cabeça do cavaleiro, subitamente, está cheia de imagens,
palavras, delírios...
Os
sons e a dinâmica da luta se afastam e, numa farpa do tempo, ele
imagina ou sonha ou vive uma outra vida:
É então um homem
calmo que convive intimamente com as idéias, usa os músculos e o
equilíbrio de forma muito econômica. (Caso o antigo cavaleiro
pudesse se ver assim, pensaria ver uma estátua)
Dessa
vez a vida de aventuras e batalhas só existe nas histórias que ele
lê e inventa. São tantas e tantas essas histórias... um sorriso
muito peculiar revela o quanto de apreço ele tem por isso tudo.
Mas, hei! é só uma
farpa do tempo, lembra? E aquele homem sereno está morrendo agora.
Está prestes a fechar os olhos definitivamente...Num fragmento de
uma farpa do tempo (nesse instante, veja!) ele está escolhendo a
vida que quer imaginar, sonhar ou viver dessa vez. E um último
sorriso (aquele mesmo) revela o quanto ele gosta disso.
Aventura Particular
Nenhum comentário:
Postar um comentário