domingo, 9 de março de 2014

Caminhos e Migalhas de Pão


Estou juntando material para fazer um blog sobre dois irmãos que calharam de ser meus tios-avôs, Octávio e Armando Sgarbi. O primeiro, que teria completado cem anos há alguns dias, eu só pude conhecer pelos escritos, histórias, ilustrações e alguns quadros. O segundo foi o interlocutor de tantas infinitas prosas da minha infância nas aventuras do verbo, da rima das cores e do traço. E foi assim que, olhando as pastas com desenhos e contos do tio Armando, achei um texto de minha autoria que tinha sido posto lá, como homenagem - essa “Farpa” que deixo agora com vocês - realizado algumas horas depois de sua morte, para tentar driblar a dor pela perda de uma das pessoas mais brilhantes e queridas desse meu mundo. A figura que fecha a postagem foi concebida durante esse reencontro...



Farpa


         Mais uma batalha. No meio da confusão, destaca-se um cavaleiro de movimentos precisos, desferindo golpes que derrubam os inimigos um a um, após lhes revelar o sabor da espada.

Se o cavaleiro possuísse uma mente abstrata, ela estaria vazia agora, sem pensamentos, só ritmo e ação.

         De repente (de onde?), ele sente o toque de uma lança ou lâmina e percebe que está morto. Cai, cumprindo seu papel com o final dos músculos e do equilíbrio. O chão lhe parece absurdo assim tão próximo do rosto e a cabeça do cavaleiro, subitamente, está cheia de imagens, palavras, delírios...

Os sons e a dinâmica da luta se afastam e, numa farpa do tempo, ele imagina ou sonha ou vive uma outra vida:

         É então um homem calmo que convive intimamente com as idéias, usa os músculos e o equilíbrio de forma muito econômica. (Caso o antigo cavaleiro pudesse se ver assim, pensaria ver uma estátua)

Dessa vez a vida de aventuras e batalhas só existe nas histórias que ele lê e inventa. São tantas e tantas essas histórias... um sorriso muito peculiar revela o quanto de apreço ele tem por isso tudo.

         Mas, hei! é só uma farpa do tempo, lembra? E aquele homem sereno está morrendo agora. Está prestes a fechar os olhos definitivamente...Num fragmento de uma farpa do tempo (nesse instante, veja!) ele está escolhendo a vida que quer imaginar, sonhar ou viver dessa vez. E um último sorriso (aquele mesmo) revela o quanto ele gosta disso.

Aventura Particular

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