Não
conheço uma criança sequer que despreze a chance de ouvir historias da
Bíblia. Seja no Velho ou Novo Testamento, as passagens tem todos os
elementos pra conquistar as mentes infantis. Heróis, Vilões,
amores, batalhas e muita magia e fatos fantásticos. Bem, eu pelo
menos adorava. Discutia com meus pais, meu irmão e, eventualmente
algum amigo, incauto defensor de sua crença: “Poxa, então será
que o Sansão era idiota?” ou “Depois que o Lazaro reviveu, nunca
mais ficou doente?” ou ainda “No Diluvio, quem ficou responsável
pela preservação das especies da América do Sul? E da Austrália,
aquele monte de bicho esquisito?”. Minha cabeça fervilhava
distante do fervor religioso. Nunca fomos frequentadores de igrejas,
templos ou qualquer tipo de lugar dessa índole.
Uma vez,
na escola onde eu fazia o curso primário, estávamos nós, aquele
bando de pirralhos, formados pra entrar em sala, quando a Tia
Fulaninha da Secretaria pegou a mão do primeiro da fila e foi
desviando do caminho, dizendo que, naquele dia, tinha vindo um padre
(reparem que era uma escola municipal, e não daquelas ricas de
freira nem nada) e “a gente ia se confessar” antes da aula. Eu
sei que nessa hora me bateu um baita desespero: “Que mané padre
que nada! Eu não fiz coisa errada, não vou confessar droga nenhuma! Quem
tivesse vacilado que se acusasse.”
Nisso, a
Tia Marielena percebeu minha indignação e disse que não era
obrigado a nada não, só quem tivesse feito Primeira Comunhão. Eu
pensei “dessa me livrei!”. Quase gritando, falei pra professora
“Não participei disso não, Tia, tô inocente na parada!”.
Lembro que sai correndo da fila, pensando que quando fizesse a
Primeira, ia tentar fazer sem Munhão.
Pois mesmo
assim, apesar do abismo entre meu cotidiano e o formalismo religioso,
as influências são muitas. Fiz vários desenhos e pinturas com
temas bíblicos. Este, que deixo com vocês agora, foi cometido no
século passado. Estava guardado sem o devido cuidado e, um dia
quando que fui ver, tinha ficado todo oxidado e amassado. Na mesma hora, fotografei-o e guardei o arquivo em 'Meus Documentos'. Pura
sorte! Menos de um mês depois, alguém que arrumava a minha casa
pegou aquele papel enrolado (tamanho A2, ou coisa que o valha) e
jogou no lixo pra nunca mais.
Álbum de Família ou Deus com Adão e Eva
Desenho a nanquim com cerca de 80 por 60 cm, recuperado digitalmente a partir de uma fotografia